A decisão do governo federal, tomada ontem, de se desligar da participação na Declaração do Consenso de Genebra sobre Saúde da Mulher e Fortalecimento da Família, assinada em outubro de 2020, na gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL), dá continuidade a uma série de medidas que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva tem tomado para reposicionar a governança do Brasil. 

O movimento, definido pelos ministérios das Relações Exteriores, da Saúde, das Mulheres e dos Direitos Humanos e da Cidadania, é o primeiro a alinhar o Brasil internacionalmente com a nova postura do governo em relação à defesa dos direitos, da saúde e das liberdades das mulheres.

Em nota assinada por todos os ministérios, o governo confirmou a intenção da atualização do país em fóruns e mecanismos internacionais que tratam dos temas voltados à mulher. "O objetivo é de melhor promover e defender os mais altos padrões dos direitos humanos e liberdades fundamentais, em linha com a legislação brasileira e os compromissos assumidos pelo país no plano regional e multilateral", afirmou.

O objetivo primordial da declaração é promover o direito das mulheres, em que tanto adultas como crianças e jovens devem ter igual acesso à educação, a recursos econômicos, a participação política, ao emprego e a postos de liderança, e a altos padrões de saúde. Mas enfatiza que, dentro do direito das mulheres, há o papel da família e a necessidade de se proteger o direito à vida. O acordo do qual o país se retirou, apesar de assumir o compromisso de defender políticas públicas que ampliem o acesso das mulheres à saúde, principalmente sexual e reprodutiva, não insere na sua diretriz uma discussão aprofundada sobre a pauta do aborto.

Casos excepcionais

Pelo documento, as mudanças relacionadas ao aborto que, no Brasil, é permitido em três situações — quando a gestação oferece risco à vida da mãe, em caso de gravidez por estupro ou quando o feto é comprovadamente anencéfalo —, devem ser decididas em nível nacional e de acordo com a legislação de cada nação. Apesar disso, a declaração afirma que "não se deve promover o aborto como método de planejamento familiar em nenhum caso" e que os países não tem "obrigação internacional" de financiar o ato, o que exime os governos de lidar com o assunto sob a ótica da saúde pública.

"O Brasil considera que o referido documento contém entendimento limitativo dos direitos sexuais e reprodutivos e do conceito de família e pode comprometer a plena implementação da legislação nacional sobre a matéria, incluídos os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS)", explica a nota conjunta. "O governo reitera o firme compromisso de promover a garantia efetiva e abrangente da saúde da mulher, em linha com o que dispõe a legislação nacional e as políticas sanitárias em vigor sobre essa temática, bem como o pleno respeito às diferentes configurações familiares", acrescentou.

O acordo foi assinado por 31 países. Ao se comprometer com o documento, o Brasil ainda exercia papel de incentivar internacionalmente pautas ultraconservadoras e de base religiosa, assim como os Estados Unidos na gestão de Donald Trump — o país deixou o acordo quando Joe Biden assumiu o governo. Entre os atuais signatários estão países com governos autocratas, como Egito e Hungria, e sob regime ditatorial, como Iraque, Paquistão e Arábia Saudita.

Por Correio Braziliense

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