O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou como inconstitucional o trecho da lei baiana que estabelecia prazo para a regularização de terras de comunidades remanescentes de quilombos e de fundo e fecho de pasto. A decisão foi tomada durante sessão realizada nesta quarta-feira (6/9).

Segundo o trecho da lei, os pedidos de reconhecimento e regularização fundiária dessas áreas deveriam ser feitos até 31 de dezembro de 2018. Com isso, na prática, a legislação estabelecia um marco temporal para a reivindicação dos espaços. Após a decisão, não há prazo para fazer os pedidos e novas solicitações podem ser feitas.

O julgamento da lei aconteceu 20 dias depois do assassinato da líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, conhecida como Mãe Bernadete. Ela foi morta no quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador.

O assassinato da líder abriu um debate sobre a violência contra os quilombolas na Bahia e sobre como o processo de regularização das terras pode contribuir para a segurança das comunidades. No caso do Pitanga dos Palmares, o quilombo foi reconhecido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), através do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID). Apesar disso, o processo de titulação ainda não foi concluído.

Sobre o "marco temporal" das terras quilombolas na Bahia, a Procuradoria-Geral da República (PGR), que é a autora da ação, argumentou ao STF que a medida é inconstitucional e que o prazo limita a existência dessas comunidades.

Durante a sessão desta quarta, a presidente do STF, Rosa Weber, argumentou que a regularização das terras é uma forma de proteger as comunidades tradicionais.

"O debate aqui envolve o termo final para aplicação do instrumento protetivo para a concessão de direito real de uso previsto em lei. Não se discute sobre momento específico da ocupação em si, mas sim sobre a aplicação deste limite temporal para requerer a proteção territorial", afirmou.

Rosa Weber votou contra o marco temporal e foi seguida pelos ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia. O ministro Nunes Marques divergiu parcialmente e os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e André Mendonça não participaram do julgamento.

O Tribunal, por maioria, conheceu apresentação direta e julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo segundo, do artigo terceiro, da lei 12.910 de 2013 do Estado da Bahia, declarou a presidente do STF ao final da sessão.

Comunidades quilombolas e de fundo e fecho de pasto

As comunidades remanescentes de quilombos têm origem no período de escravidão no Brasil. Os espaços de resistência foram fundados por pessoas escravizadas que fugiam da exploração.

Já as comunidades tradicionais de fundo e fecho de pasto vivem em áreas rurais do sertão do estado da Bahia. Os grupos criam animais em terra de uso comum.

No julgamento, os ministros avaliaram se a definição de um prazo para a reivindicação legal das terras é constitucional. A decisão é válida somente para a Bahia — ou seja, não tem repercussão geral.

O resultado pode criar, no entanto, um precedente jurídico para a análise da validade de outras leis estaduais que seguirem a mesma linha.

Ação

O caso chegou ao Supremo a partir de uma ação apresentada pela PGR, em setembro de 2017. O pedido foi assinado pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Para a PGR, ao estabelecer um limite para a regularização das áreas, a lei viola princípios constitucionais, como o direito a proteção e promoção da diversidade cultural, da dignidade humana e do pluralismo político.

"Por meio dessas normas, a Constituição protege os povos e comunidades tradicionais do país, garante seu direito de existir e preserva a continuidade de seus modos de criar, fazer e viver", afirmou.

"Não há dúvida, portanto, de que a Constituição da República garante o direito fundamental das comunidades de fundo e fecho de pasto a existir como grupo e a preservar sua identidade, traduzida nos seus modos de criar, fazer e viver", prosseguiu.

A Procuradoria argumentou, ainda, que a Constituição não criou "limite temporal" para o reconhecimento das comunidades.

Fonte: g1

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